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terça-feira, agosto 15, 2006
Tiago

O meu irmão fazia hoje 29 anos. Chamava-se Tiago e morreu há sete anos, num acidente de automóvel. Eu tinha 18 e, nessa altura, uma pessoa de 22 anos parecia-me ser já uma pessoa muito mais velha, com imensas responsabilidades. É a primeira vez que falo dele neste blog, o que é normal. Tento que este espaço seja divertido (atenção, eu disse "tento"), e este assunto não é, de todo, animado. Mas hoje apetece-me, estou assim assim, talvez seja por isso. Cá em casa não se fala muito nele. É normal, acho que ainda está tudo um bocado em estado de choque, mesmo que já lá vão sete anos. Para mim, foi ontem que o telefone nos acordou às três da manhã, que a minha mãe desatou aos gritos, que o meu pai se voltou a deitar, sem dizer nada, e que eu fiquei ali, de pé no quarto dos meus pais, sem saber qual deles atender primeiro. Lembro-me perfeitamente de as pessoas nos entrarem em casa madrugada fora, das cenas de gritos e choro, de eu adormecer e acordar cedo a pensar que tinha sonhado. De saltar da cama, de perceber que era mesmo a sério, de ir ao sítio do acidente e aí sim, deparar-me com a realidade e com a irreversabilidade da coisa. Um carro completamente destruído, toda a gente a agarrar-me. Deviam estar com medo que me desse uma coisinha má e eu caísse ali redonda, mas eu só queria ver.
Acho que não há um único dia em que não me lembre disso. Tenho medo de me ir esquecendo das feições, da maneira de ser. Às vezes olho-me ao espelho e fico assustada com semelhanças que nunca tinha visto antes. O que aconteceu é de uma tristeza que não se pode imaginar. Vejo como os meus pais envelheceram dez anos, como perderam tanta alegria e consome-me saber que terão que viver com aquela dor para sempre. Não há injustiça maior.
Esforço-me por não me esquecer do tom de voz, da paixão pelo Benfica, pelos ataques de parvoíce típicos dos irmãos mais velhos, pela mania irritante de quem acha que sabe tudo e tem sempre razão, pela aversão à Matemática. Quando me perguntam se tenho irmãos a tendência é sempre para dizer que não. Explicar a história é complicado, as pessoas ficam constrangidas e, a maior parte das vezes, acabo sempre por levar com um "vê-se logo que és filha única". Já me habituei e não ligo.


Textinho especialmente dedicado a todos aqueles que passam a vida a queixar-se que este blog são só futilidades. Como podem ver, meus queridos, tenho coisas "sérias" suficientes para me chatear até ao resto dos meus dias. Posso brindar-vos com uma todas as semanas, querem?

5 comentários:

  1. Querida Pipoca, estou a ler o teu blog à pouco mais de um mês e como tenho gostado bastante, tenho-o lido desde o início. E identifiquei-me contigo neste tema. Perdi o meu irmão mais novo há 3 anos e meio. Ele tinha só 17 anos e eu 21. Sei o quanto dói... e o que mais dói é ver a eterna dor dos pais. A minha mãe, na madrugada em que a polícia entrou em nossa casa para nos dar a infeliz noticia, envelheceu 20 anos. N~so dizia nada, estava branca, pálida como nunca a tinha visto antes.O meu pai, estava doido..a chorar a gritar... Momentos muito dolorosos que jamais serão esquecidos. Tenho também uma irmã do meio. Quando me perguntam se tenho irmãos eu digo que sim, dois. Não sou capaz de dizer que não. Mas entendo a forma como tu lidas com a situação. Todos lidamos com as mesmas situações de maneira diferente. Em minha casa também não se fala no assunto. E a minha mãe nem sequer entra no quarto do Miguel. Isto foi apenas um desabafo. Infelizmente notícias destas vêm-se todos os dias. Beijinho.

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  2. pronto, e agora eis-me aqui lavada em lágrimas. quero só dizer que eu não acho nada que a imagem que transmite seja fria ou fútil. de todo. o que eu acho é que é mt inveja desse 1,70 com 55 kg, mas enfim...

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  3. Tenho 24 anos e estou a estagiar, deslocada da minha cidade, a minha Lisboa linda. Há dias em que não nos apetece fazer nada e numa tentativa de diminuir esse tédio, pus-me a ler os teus posts antigos. Calhou. E no meio de tanto pagode, deparei-me com este post. Acompanho o blog há 3 anos e não sabia deste episódio triste da tua vida. Para mim, és uma grande mulher. Uma grande mãe. E um exemplo.

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  4. Encontrei isto hoje e nem sei o que te dizer! Sinto que tenho de te dizer alguma coisa porque me deste tanto neste ultimos anos e sem saberes. Fizeste-me rir quando estava triste e por isso já te devo muito.
    Admiro-te. És uma lutadora e que conseguiu tudo com trabalho. É por isso que tudo o que tu mereces é ser feliz. Sofreste uma grande perda mas Deus soube-te recompensar com outras coisas. És saudável, o teu filho é lindíssimo e tens uma carreira de sucesso.
    Admiro-te Pipoca e nunca desistas de nada. És a maior e a melhor.

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  5. És grande Pipoca.

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Teorias absolutamente espectaculares

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