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domingo, fevereiro 07, 2010
Era na papelaria da Suzi, na rua d'O Século, que nos abastecíamos para o Carnaval. Regra geral, um pacote de serpentinas para cada um, que tinhamos de dosear com moderação. Os papelinhos eram feitos com um furador. Horas a furar papel, para conseguir encher um saco. Depois, com o dinheiro que se ia angariando no troco dos recados, lá se voltava à Suzi para comprar estalinhos, raspas, bombinhas de mau cheiro, bisnagas, e animais de plástico que atirava pela janela da minha vizinha da frente. Até ela largar em tal gritaria e histerismo que eu era obrigada a ir lá recolher as aranhas, as cobras e os ratos. Os estalinhos eram guardados para uma colega de trabalho da minha mãe. Quando a senhora estava no seu melhor, absorta nos seus pensamentos, eu ia pé ante pé, aquecia o estalinho com a boca, e tau! Ela dava um salto, tremia por todos os lados e ficava ainda mais gaga do que já era habitualmente. Depois queixava-se à minha mãe, que me dizia que eu não podia fazer aquilo, que qualquer dia a mulher tinha um enfarte e depois é que era. As raspas, umas coisinhas castanhas, eram gastas nas paredes da rua, até ter os dedos negros. Só faziam barulho e valiam umas queimadelas, de vez em quando, mas aquilo era a loucura. Já as bombinhas de mau cheiro eram guardadas para usar na clandestinidade da escola. Lavo as minhas mãos, nunca usei nenhuma, tinha medo de ser apanhada, mas deixava que os meus colegas agissem e levassem os professores ao desespero. Alguns. Outros havia que nos obrigavam a ficar na sala, e ai de quem ousasse pensar em abrir uma janela. Quando a coisa corria bem, era motivo de conversa durante três dias. Claro que nem tudo eram rosas. Havia a parte chata do Carnaval. Nomeadamente, ir a rezar até à escola para não levar com um balão de água na cabeça. Ou, pior, com um ovo, porque nessa altura (e, desconfio, ainda hoje) a malta ainda não tinha bem a noção que estava a lançar comida pelos ares, e que havia fome no mundo, e etc e tal. Por isso eu ia bem encostadinha aos prédios, a pedir a todos os santos para chegar à escola imaculada. Nem sempre correu bem. Hoje não sei como é que os putos brincam ao carnaval. Tenho para mim que alguma lei qualquer já deve ter proibido a venda de estalinhos, raspas e outros que tais. Entretanto, já não acho graça nenhuma ao evento. Mas estou tentada a passar numa papelaria só para ver se ainda há estalinhos.

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Teorias absolutamente espectaculares

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