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sexta-feira, fevereiro 01, 2008
Estou farta de gajos*

Lembrei-me de introduzir o tema “viver juntos” à hora de almoço. Pareceu-me uma boa ideia discutir a vida a dois enquanto esperava por um bife e me debatia com o dilema “satisfazer a gula Vs aumentar os metros quadrados de rabo”. A coisa não estava a correr mal. Eu apregoava o quão boa namorada ia ser, os jantarinhos que lhe ia preparar ao fim de um dia de trabalho, os serões no sofá com chaise-longue a ver filmes daqueles mesmo bons. E ele, que não é dado a grandes euforias, até me conseguiu ouvir por alguns minutos, sem revirar os olhos de impaciência nem simular um desmaio súbito para pôr fim à conversa. E foi então que o ouvi dizer “eu acho que, mais cedo ou mais tarde, vamos ter que…”. E houve uma pausa. Não mais que dois segundos, mas o suficiente para eu ouvir sinos, ver um vestido de noiva Vera Wang, ouvir a Ave Maria de Schubert, ver o meu pai em lágrimas, a encaminhar-me para o altar, emocionado por a filha ter, finalmente, desencalhado. Acho mesmo que pus a mãozinha a jeito, porque depois daquele início de frase tão promissor, e depois de eu ter feito um rol exaustivo de todas as vantagens da vida em comum, só se podia seguir um anel de noivado. Até que veio o resto. “Acho que, mais cedo ou mais tarde, vamos ter que ir ao cinema”. “Hã?”. “Vamos ter que ir ao cinema. Há uma data de coisas para ver”. O bife caiu-me mal. E é por isto que estou farta de homens, pela fobia ao compromisso. Aguento tampas de sanita levantadas, aguento pêlos no lavatório, aguento que respeitem mais o clube do que a própria mãe, aguento que comecem a traçar o testamento aos 36 graus de febre. Até nem me incomoda por aí além que não saibam distinguir um óbvio bege dum ainda mais óbvio caqui. São limitações, pronto. Mas homens de 30 anos que recusam abandonar o lar materno, isso já me causa alguma urticária. Não fiquei surpreendida. Afinal, trata-se do mesmo homem que num daqueles testes idiotas de revistas assinalou que a coisa que mais se assemelhava a tortura era o casamento. Não era a sede, não era a fome, não era perder um testículo. Era mesmo casar.

*Crónica publicada na revista Time Out Lisboa, no tema Feminino vs Masculino

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